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– Dezessete anos… o que fizemos nesse tempo todo? Casamos, amamos, descasamos, desamamos, nos iludimos, nos iludiram, iludimos outros… erramos e acertamos. Enfim chegamos a esse encontro. Esse reencontro.
– Como, reencontro? Somos outros. Completamente diferentes. Eu não estou encontrando alguém que conhecesse.
– Eu sei… se há reencontro, é com nós mesmos, em outro tempo.
– Se eu lhe amo como penso que amo, perde-se o referencial, porque nunca lhe amei antes. E isso torna tudo muito mais maravilhoso, porque seria muito fácil reavivar um amor não resolvido, uma paixão adormecida. Isso significa que eu posso voltar a amar, que eu posso querer me dedicar a alguém, que eu posso começar a construir minha vida ao lado de alguém que escolhi.
– Que eu posso recomeçar, deixar de ser só? Ainda não é tempo pra isso. Precisamos de mais tempo, mais fatores propícios pra que essa união se concretize. Para que os caminhos verdadeiramente se cruzem e sigam juntos a partir desse encontro, e não apenas se cruzem num ponto único e siga cada um o seu rumo, deixando para trás apenas um ponto de intersecção, como o cruzamento das linhas de um X.
– Se eu não recomeçar agora, a partir desse ponto, a linha se perde.
– Se eu não lhe tiver agora, creio que não nos teremos futuramente.
– “Tinha cá pra mim, que agora, sim…”
– Essa sua baixa estima não lhe deixa ver o que se passa realmente com a gente. Temos duas realidades. E são duas realidades completamente diferentes, futuro e passado, partida e retorno…
– “Perder-se de si mesmo…” em uma Terra Estrangeira. Já vi algumas vezes.
– Encontrar-me! Não sei se posso me perder com você… ainda.
– Os seus nãos são nãos para mim ou para você? A quem você está negando tudo isso?
– Você não entende… não sou eu, não é você…
– Meus desejos caem no vazio, minhas esperanças desabam sobre seus ombros e você as deixa rolar até o chão…
– Seu egoísmo, seus desejos… e os meus?
– Seus medos…
– Desejos.
– Onde?
– “Autoridade sobre a razão”… isso lhe lembra algo?
– Romantismo? Isso soaria melhor se fizesse parte de minha fala.
– Esse romantismo que você critica é falso, uma projeção pseudoburguesa de alguma coisa…
– Basta. Eu creio nisso. Mas meu coração se angustia se penso em lhe perder. E quanto a esse aperto no peito não há nada que minha razão possa fazer.
…
– Eu preciso de algo seu. Eu preciso que me forneça coisas importantes para mim. Esse vínculo com o meu passado ainda é forte. Não que o projete em você, é que é um momento mágico, feito de encantamento. Poderia ter sido com outra pessoa, mas foi com você. Se tivesse sido com outra pessoa, talvez eu lhe pedisse o mesmo, se estivesse em suas mãos a possibilidade de realizar. Eu preciso.
– Eu me nego. Não sei o porquê, mas não quero. Não me entrego. Ou melhor, acho que sei o porquê: tenho medo de mim. Ou não permito que entre ainda em minha vida.
– Ou sou eu ou é você a razão dessa impossibilidade. Onde está a verdade?
– Isso não funciona assim. É muito mais longe do que “podemos” alcançar. Somente eu posso alcançar.
– Mas você não quer. E, pior, precisa de mim para provar que não pode. Pura ironia.
– É contraditório…
– Mas é, infelizmente, a verdade.
– Isso lhe faz sofrer. Eu me odeio por isso.
– Isso só deveria lhe fazer bem. Eu querer lhe fazer bem não lhe faz bem, mas isso tudo que acontece e que aconteceu, sim. Até meus erros têm peso maior que o merecido em função do bem que trazem em seu reconhecimento. Seu medo.
– Minha vida…
…
– Se eu quero? Claro que sim. Só não consigo demonstrar.
– Então não quer. Seu corpo fala, lembra?
– Meus olhos estão em você. Meu corpo está em você. Minha mente está em você.
– Falta algo…
– Meu coração?
– Não… ainda falta eu estar em você. Quando você vai deixar que eu entre?
– Eu já deixei…
– Eu ainda não sei se acertei. Estou mesmo no lugar certo? Acenda uma luz, por favor. Está tão escuro.
– Não precisa. Deixe eu lhe abraçar e você vai sentir no calor de meus braços, no aperto verdadeiro, que este é o lugar.
– Artifícios…
…
– Quanto tempo ainda nos falta?
– Nos resta?
– Pode ser… você entendeu.
– Há uma diferença sutil, você sabe. Aliás, não é tão sutil assim. É fundamental.
– Quanto?
– É você quem me diz. Quanto tempo ainda para me aceitar?
– Você já está aqui há muito tempo e não sabe. De uma forma muito especial.
– Eu tenho medo do que não é dito claramente. É sua proteção de novo.
– Você viveu tanto, teve tantas experiências e parece não ter aprendido muito, não é?
– Não precisava ser de forma tão direta assim, mas eu aceito o desafio. Vamos lá. Aprendi, sim. Mas as minhas lições, apesar de serem as mesmas que as suas, tiveram outra serventia: mostraram que, apesar de sofrer, magoar, chorar, machucar, todas elas me tornam mais forte. Não digo mais insensível, digo mais forte. Eu sei que “…vou sofrer, vou chorar, mas vou voltar a amar… É porque sinto exatamente aquilo tudo que sente qualquer um que respira… O que uma pessoa pode nunca é deixar de ser e fazer e acontecer…”
– Você e suas referências… seu romantismo…
– É um dos meus defeitos. Um dos preferidos.
– Talvez me falte um pouco dessa coragem, desse defeito…
– Não, talvez me falte maturidade pra encarar a realidade. Talvez eu precise crescer mais um pouquinho. Só falta eu te querer, te ganhar e te perder; falta eu acordar, ser gente grande pra poder chorar. Mas crescer do seu lado vai doer muito… eu não aceito com facilidade certas críticas e sou meio autodidata nesses assuntos. Uma rebeldia burra. Perdão pelo pleonasmo.
…
– Você me coloca escolhas a fazer. Escolhas que eu não gostaria de ter que fazer.
– Quais? Eu não coloco escolhas à sua frente. Eu coloco minhas situações, minhas dificuldades. É você quem opta por encará-las dessa forma.
– Eu não sei o que fazer. Quer dizer, racionalmente, eu sei. Mas minha vontade, meu sentimento e meu desejo de acertar dizem outra coisa. Como ficar sem você?
– Você nunca estará sem mim. Eu estarei sempre com você, porque vivemos muito intensamente tudo. Até mesmo este momento de decisão difícil.
– Tempo, espaço… essas coisas são tão complicadas. E tão traiçoeiras.
– Nós estaremos sempre juntos.
– Não creio. Soa como uma espécie de “minimizador de dor”. E você sabe muito bem como fazer isso.
– Eu?
…
– Nossa história daria um livro…
– É… acho que não. No máximo um post na internet.
– E se fosse um post, como você escreveria o final?
– Não sei ao certo…
– Diga… Como é que terminaria a história?
– Que tal aqui?
– Logo aqui neste blog que ninguém lê…?
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